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Luto e despedida em tempos de Coronavírus

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Psicólogo fala sobre os impactos da saúde mental durante a pandemia enfrentada e como se recuperar do sofrimento pela perda de um ente querido, ocasionado pelo Covid-19. Sendo que atualmente só é possível realizar sepultamentos rápidos e sem velório

As mortes por Coronavírus podem ser contabilizadas, mapeadas, colocadas em gráficos e publicadas diariamente, mas cada pessoa que faleceu em decorrência desse vírus não são apenas números e estatística para familiares e amigos. Há algo de novo e cruel no luto relacionado às mortes pelo Covid-19. Sob o risco de contaminação, algumas etapas que seriam fundamentais no processo de aceitação da perda foram suspensas: o de não poder acompanhar o ente querido em seus últimos dias no hospital, velórios e sepultamentos mais rápidos e com poucos familiares à distância e com caixões lacrados, ficou ainda mais difícil realizar a despedida.

Segundo o psicólogo Stênio Marques, que atende pacientes na The Clinic, no setor Marista, antes de falar em luto, faz-se necessário compreender o que o antecede: a morte. A morte é um acontecimento que faz parte do desenvolvimento e está presente no cotidiano de todos, porém está inserida em um contexto sócio histórico de negação, por vários motivos. Os sujeitos sociais procuram não entrar em contato com ela, tentando desconsiderar inclusive seu processo natural, pelo desconforto da dor e da perda. A tendência é considerar a morte apenas na velhice. O modo como a finitude foi e é encarada pelo homem ao longo do tempo nos mostra como a humanidade caminhou para a negação, uma vez que, hoje a morte é vista como representação de fracasso e interrupção nos projetos de vida.

“Ao acordarmos, respiramos, pensamos e, assim existimos. Mas a existência precisa ter um sentido permeado por momentos, conquistas, emoções, caminhos, autoconhecimento, projetos, sonhos, vida. Ao perder alguém que se ama, parece que tudo isso passa a não ter mais sentido”, disse o psicólogo.

Como amenizar o sofrimento do luto na pandemia?

O psicólogo ressalta que o processo de luto é muito particular, as emoções e os sentimentos são diversos. “No luto, é normal a pessoa passar por uma série de reações ao sofrimento, que vão do esgotamento físico e emocional a dificuldades no sono, na alimentação e sensação de perda de sentido da vida”, acrescenta.

Stênio sugere respeitar todas reações e o seu tempo, que é particular para cada indivíduo. Assim, cuidados e caminhos seguidos por um podem não valer para outro. De qualquer forma, é importante ter consciência de que perda pelo Covid-19 é, por si só, um fator de risco em potencial para um luto traumático, merecendo atenção na sua condução pela comunidade de apoio ao enlutado, que deve ser delicada e sensível. Por isso, é necessário identificar se o volume de sofrimento não excede longos períodos e se isso estiver atrapalhando a continuidade das funções da vida, buscar por auxílio especializado de um profissional psicólogo.

A primeira coisa que possa amenizar o sofrimento do luto no período de pandemia, é a compreensão e aceitação da morte, de que é algo natural e, que não se tem controle absoluto. Essa aceitação possibilita viver o luto e não de luto, ou seja, processo pelo qual é necessário vivenciar. Outra forma para amenizar esse sofrimento é o de falar sobre e o de não se isolar. A fala tem a capacidade de aliviar a dor, transformando o sofrimento em conforto.

Cerimônias de passagem, como velório e sepultamento, são importantes na construção de sentido da perda do ente querido, assim como para o processo de recuperação do luto. Se não for possível a realização nas formas convencionais, é relevante tentar elaborar algum ritual que faça sentido para familiares e amigos próximos. Por exemplo, o uso das mídias sociais para alguma homenagem futura de despedida e até mesmo o apoio social. Outro aspecto importante, é tentar na medida do possível, lembrar-se dos aspectos positivos da relação e do amor envolvido, de forma que os sentimentos e lembranças negativas dos últimos momentos não se sobrepõem os momentos bons e felizes.

 

Perder é algo difícil de lidar, e quando é alguém que se ama é ainda mais complexo, principalmente em tempos de COVID-19, uma vez que, não se tem o tempo necessário para a despedida. Algo que dificulta na elaboração da perda e consequentemente de viver o luto é o tempo do velório. Ele precisou ser reduzido, com isso, as precauções necessárias aumentaram para prevenir a contaminação, inclusive na quantidade de pessoas no momento da cerimônia. Nesse sentido, após o sepultamento sempre há um espaço entre familiares e amigos próximos para lembrar histórias, cantar músicas, ler textos, celebrar a vida, uma forma de homenagem de quem partiu, ou seja, uma espécie de despedida, mesmo que à distância.

 

Se é parente ou amigo da pessoa próxima ao falecido, uma ligação telefônica pode ser um ótimo suporte por oferecer acolhimento e, ainda assim, manter as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). Não deixar a pessoa sozinha em sua dor, a menos, é claro, que ela queira (o que se deve respeitar) também é um suporte importante no momento de perda. Atitudes como estas podem auxiliar significativamente no processo de passagem do luto, por fazer com que as pessoas enlutadas invistam suas energias em colocar para fora suas angústias, transformando-as em alívio.

O estresse e a ansiedade faz parte do dia a dia de muita gente, e tem estado mais evidente nos últimos meses, com o estabelecimento da quarentena provocada pelo Coronavírus. Por isso, para amenizar esses sintomas é necessário filtrar as informações sobre o assunto, inclusive evitar manter os noticiários da televisão ligados o dia todo, isso pode ser um gerador de angústia e pânico. Talvez seja um bom momento para fazer leituras e assistir filmes, contanto que se entregue à atividade. Esse pode ser um bom momento para exercitar a empatia, sendo solidário com o próximo, para com as pessoas do grupo de risco, como os idosos, que necessitam de uma atenção especial nesse período. Compartilhar histórias positivas, expressar sentimentos, por meio de atividades lúdicas como escrever, desenhar, pintar e cantar. Criar uma rotina também facilita muito, por propiciar organização e não deixar o tempo ocioso. Praticar exercícios físicos em casa, inclusive fazer uma pausa para um exercício de respiração. E por último, e não menos importante que as demais, é fazer psicoterapia, cuidar da mente, dos pensamentos, sentimentos e emoções. Esse é o processo que auxilia profundamente no autoconhecimento, na elaboração dos conflitos e na busca por bem-estar e felicidade.

 

Reflexão

Para o psicólogo Stênio, a vida é curta, e não vem com prazo de validade, muito menos alguma garantia. Cada dia é uma oportunidade única para afetos reunidos, permeados de riso, mas também de choro. Celebre, mesmo com um lugar vago à mesa, pois a família continua ali. A comida pode até continuar a dar água na boca. Invista na vida, em bons momentos, em pessoas, naquilo que lhe faça feliz. Ame hoje, fale hoje, faça hoje.

 

O profissional da mente recomenda procurar por pessoas e profissionais que possam contribuir para o recomeço. Ele ainda indica a psicoterapia como uma ferramenta que possibilita que as pessoas enxerguem novamente um mundo de possibilidades, inclusive, em conseguirem ter a sensibilidade de enxergar crianças brincando do lado de fora de suas casas, e assim a oportunidade de brindar à vida, porque esta não pode esperar. “Viva o luto para não viver de luto”, finaliza.

Delson Carlos

Delson Carlos - Formado em Marketing pela UniCambury e pós-graduado em Comunicação Digital. Assessor de imprensa e começou a sua carreira como colunista social nos jornais: A Hora, Jornal da Imprensa, Jornal Diário do Estado de Goiás, e a quase duas décadas está a frente da coluna social “Delson Carlos” do Jornal Diário de Aparecida e editor da Revista Class e do Portal Class News.

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